Na casa de chá
Autor: Patrícia Nunes
Sim, dever ser ali que deixei parte de mim...
Com a mala em uma das mãos e a latinha de alumínio vazia, caminhava pela ferrovia. O céu azul, um dia claro. De longe já se ouvia. Vinha apitando anunciando a sua chegada.
Também aquele apito ajudava os distraídos a saírem de sua estrada. Se ficasse na porta dos pés e esticasse um pouco o pescoço, para ajudar a pequenina estatura, conseguiria enxergar após a curva o trem com sua poderosa fumaça.
Os seus pensamentos são interrompidos ao esbarrar em ombros e braços coloridos que circulavam pela casa de chá.
Ellis retorna de sua lembrança de infância.Que lugar gostoso estava nesse momento! De tão convidativo não tem como encontrá - lo cinza, sem as cores dos corpos a brigar por uma mesa.
Hummm, tomaria chá de que hoje?
Amêndoas sempre é uma boa pedida. Chá de amêndoas com bolinhos de chuva. Resolvido!
Resolvida. Assim estava. Feito a terra trabalhada das lavouras de sua gente.
Enquanto aguarda o pedido, leva na imaginação a mesma mala na mão, mas agora, sem saber para onde ir? Ellis recorda a estação: Caminhava. O velho banquinho de madeira logo à frente. Que alegria para o seu cansaço. Sentada balançava as pernas e os seus pés mal tocavam o chão.
Ilustração: Helena Masseo Castro
"Sim, dever ser ali que deixei parte de mim..."
Uma ponta de felicidade. A casa da avó. Iria para lá. Abrigar-se-ia na pousada para desalento. Sim, sabia para onde ir. Era lá, na casa verde repleta de relíquias.
A casa verde com sua cristaleira e jogos de chá. As xícaras e bules em branco e dourado tinham flores pintadas na belíssima porcelana com os tons que as manhãs de primavera emprestara.Entre água que se aproximasse para compartilhar a faceirice. Era ali que os seus irmãos não adoeciam. A morte não passeava pela casa daquela família porque não sabia que era o endereço. Naquele instante feito de açúcar, afeto, bolinhos e chá, criava. O pais da desalegria desaparecia. Podia ser criança. tinha esperança.
De repente ouve: aqui moça! Olhou com olhar sonhador para o atendente e teve um sorriso retrospectivo. O seu pedido havia chegado Q realizado.
Isso, chá quentinho! As lágrimas de quase agora em forma de bolinhos de chuva. Ellis sente que recuperar sempre é feliz, mas também triste. Recuperar é nostálgico e atual.Como se aproximar daquilo que parece o início do arco iris e seu fim. A sensação é surreal.
É visitada pela música delicada que em seus ouvidos ressoava. Catedral.
O deserto que atravessei
Ninguém me viu passar
Estranha e só
Nem pude ver
Que o céu é maior
Tentei dizer
Mas vi você
Tão longe de chegar
Mais perto de algum lugar
É deserto onde eu te encontrei
Você me viu passar
Correndo só
Nem pude ver
Que o tempo é maior
Olhei pra mim
Me vi assim
Tao perto de chegar
Onde você não está
No silêncio uma catedral
Um templo em mim
Onde eu possa ser imortal
Mas vai existir
Eu sei vai ter que existir
Vai resistir nosso lugar
Solidão
Quem pode evitar
Te encontro enfim
Meu coração
É secular
Sonha e deságua dentro de mim...
Agora, sabia aonde ir. Em dias nublados a velha
estação, que ficou em seu coração, sempre e levaria de volta para a casa verde. Para a casa da esperança. Lá, tinha feito sonhos em suas tardes de chá. Pegaria a latinha de alumínio cheia de bolinhos que a sua avó fazia. Comeria. Seria feliz.
GALERIA
A música sempre fez parte da minha vida. 2014
A Música sempre fez parte da minha vida!
Meu pai era músico!
Compunha, tocava vários instrumentos,
Até cantava, com aquela sua voz grave.
Eu estudei acordeom, na minha infância e adolescência,
Apesar de não ter herdado seu ouvido musical.
Fiz alguns cursos de canto, uns rápidos, outros nem tanto,
Num esforço pra ser menos pior, tamanho meu fascínio.
Em 1985, e 1986 fiz curso de teatro no "Teatro Escola Macunaíma".
Experiência ímpar e importantíssima pra mim.
Uma das melhores coisas que fiz em minha vida!
Tanto que, em 2000, fiz outro curso no "Teatro Escola Célia Helena".
Mas, por artes plásticas, nunca havia me interessado antes!
Apesar de já ter, “me metido” na adolescência, em fazer sandálias e bolsas de couro, mais pintura em camisetas, de um jeito, totalmente, inventado por mim.
Tudo começou, então, a partir de 1998, montando um "espaço de artes" para meus pacientes, em meu consultório.
O “Espaço de Artes” destinava-se a música, teatro e artes plásticas.
Passeando por lá, nos intervalos meus e dos pacientes, montei uma caixinha, pintei-a de branco. Eram meados de 2001.
Mas e as cores? Era só pôr corantes, ensinou-me a instrutora de artes plásticas (dos pacientes).
Aí, não tinha limites, todas as cores eram possíveis!
E vieram as crianças, as minhas e não minhas crianças. Nossos encontros eram e são com tintas. Nós fazíamos e fazemos nossas cores. E tudo nós pintávamos e pintamos.
Precisava de mais. E aconteceu o "Atelier Helena Ribeiro", frequentei-o por três a quatro meses em 2002. E foi uma explosão de formas e cores, com carvões e pastéis.
Em fevereiro de 2003, fiz o curso de técnica de pintura em tecido no "Atelier Marco Mariutti".
De março a junho de 2003, frequentei o curso do artista plástico Tuneu, no "Atelier do Museu de Arte Moderna de SP MAM". Uma vez por semana. "O curso era de aquarela, mas eu usava pastel". Foi principalmente, de desenho.
Retornei ao "Atelier Helena Ribeiro" por mais um mês.
Em 07/06/03, audaciosamente, expus meus primeiros trabalhos durante uma Jornada dos Candidatos do Instituto da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo-SBPSP.
Ao final, participei do “Especial do Mês” da Sociedade – SBPSP, os trabalhos tendo ficado por uns dois meses expostos no site da mesma. Foi muito especial esta exposição.
E, plagiando Pierre Bonnard (pintor francês do século dezenove, 1867-1947):
"Quando alguém começa a pintar não pode fazer mais nada!"
Quer dizer, eu gostaria de poder não fazer mais nada, mas, não sei, não sei direito... Não sei se conseguiria não fazer mais nada...
O que eu sei, é que quando estou pintando, não quero parar para fazer outra coisa. Então, não consigo pintar de manhã, parar às 12h, trabalhar em outra atividade, e no dia seguinte repetir esta programação. Ou eu pinto, ou eu faço outra coisa... Ou eu faço semi-joia ou eu faço outra coisa. Consigo pintar e fazer semi-joia, mas não pintar e "medicinar"... E não sei o que se passa.
Digo que de "pregadores a Kombi", pinto qualquer coisa...!!!
Por Helena Masseo de Castro
médica / psiquiatra / pinturista / semi-joierista